Modelo acusado do homicídio de Carlos Castro volta hoje ao tribunal
Defesa psiquiátrica pode baixar pena de Renato Seabra
03.06.2011 - 09:12 Por Kathleen Gomes, em Washington
Dia decisivo para o futuro do caso Renato Seabra: o advogado do jovem acusado do homicídio de Carlos Castro anuncia hoje que estratégia de defesa irá adoptar. Em anteriores audiências no Supremo Tribunal de Nova Iorque, David Touger declarou aos jornalistas que ponderava usar a chamada "defesa psiquiátrica", uma determinação legal que pode reduzir consideravelmente o grau e a pena para um crime cometido nos Estados Unidos.
Esta será a quinta aparição em tribunal de Renato Seabra (Lucas Jackson/Reuters)
Contactado pelo PÚBLICO, Touger não confirmou se iria adoptar a defesa psiquiátrica; apenas disse, por email, que iria anunciar as suas "intenções" hoje no tribunal. Mas o advogado de defesa criminal Paul da Silva, com escritório em Newark, no estado vizinho de New Jersey, considera que Touger vai usar a defesa psiquiátrica, porque "não existe outra opção neste caso". "Ele tem de demonstrar que o seu cliente não tinha as condições psicológicas para formar uma intenção criminal. Se não usar essa defesa, ele não tem mais nada", diz ao PÚBLICO.
David Touger contratou um psiquiatra para avaliar o estado mental de Renato Seabra. Na última aparição em tribunal, a 29 de Abril, o advogado explicou que aguardava o parecer do médico para determinar se iria avançar para a defesa psiquiátrica.
Existem dois tipos de defesa psiquiátrica: o advogado poderá alegar insanidade, argumentando que o seu cliente não tinha consciência de estar a cometer um crime; ou alegar que ele agiu sob a influência de uma "perturbação emocional extrema", isto é, que foi dominado por uma violenta pressão emocional ou psicológica.
Um exemplo comum de "perturbação emocional extrema" é um caso de violência doméstica, sugere Paul da Silva. "Imagine uma mulher que tem sido maltratada pelo marido ou namorado durante anos e anos: um dia, depois de lhe bater, ele cai bêbado na cama, e ela pega numa faca ou numa pistola e mata-o. Essa mulher está num estado psicológico muito diferente do que um indivíduo que decide fazer um assalto à mão armada e matar alguém com um tiro na cabeça. E o nosso sistema legal reconhece isso. A punição é menor no primeiro caso do que no segundo."
A defesa por insanidade é o que os advogados chamam "uma defesa completa": se o réu conseguir provar em tribunal ou convencer o júri de que agiu irracionalmente, será ilibado. Mas isso resultará no seu internamento num hospital psiquiátrico, quase sempre indefinidamente.
Taxa de sucesso é baixa
A defesa por insanidade implica ainda que o réu tenha um historial psiquiátrico, isto é, antecedentes de perturbação mental, o que não parece verificar-se no caso de Renato Seabra. Paul da Silva acredita que Touger irá optar pela defesa devido a perturbação emocional extrema, que, se for bem-sucedida, deverá diminuir o grau e pena do crime, uma vez que reduz a culpa do réu.
Esta opção exclui qualquer tratamento psiquiátrico. Renato Seabra, que actualmente enfrenta uma acusação de homicídio em segundo grau (murder in second degree, com intenção de matar, equivalente ao homicídio qualificado no Código Penal português) e uma pena de prisão entre 25 anos e perpétua, poderia ver o seu crime reduzido para uma categoria de homicídio menos grave, devido a circunstâncias atenuantes (manslaughter, equivalente ao homicídio privilegiado). A pena, neste último caso, é de 15 a 25 anos de prisão no estado de Nova Iorque.
"A vantagem deste caso para a defesa é que a única pessoa viva que sabe o que aconteceu naquele quarto [de hotel, onde Carlos Castro foi assassinado a 7 de Janeiro] é o réu", diz Paul da Silva. "E ele tem liberdade para contar a história que quiser sem que alguém o possa contestar."
O recurso à defesa psiquiátrica no sistema legal americano é raro: o argumento da insanidade é utilizado em menos de um por cento dos casos criminais e quando vão a julgamento só 25 por cento têm sucesso. Um estudo realizado em 2002 no estado de Nova Iorque mostra que dos 16 casos de alegada perturbação emocional extrema que chegaram a julgamento, só um teve sucesso.
"O que não quer dizer que as condições mentais do réu não tenham um efeito sobre a sua pena", adianta Christopher Slobogin, professor de Direito na Universidade de Vanderbilt, no Tennessee, e especialista nas áreas de cruzamento entre o sistema legal e a Psiquiatria. Antes de mais, a acusação pode concordar que o réu tem problemas e decidir não ir a julgamento, propondo um acordo com a defesa: "Se vocês se declararem culpados de homicídio privilegiado, nós retiramos a acusação de homicídio qualificado." Outra hipótese é o réu ser condenado por homicídio qualificado, mas o juiz tem alguma flexibilidade para atribuir a pena mínima tendo em conta o seu estado mental.A audiência que se realiza esta manhã em Nova Iorque (15h30, hora de Lisboa) é a quinta aparição em tribunal de Renato Seabra, que se encontra detido na prisão nova-iorquina de Rikers Island desde Abril.